
No último dia 4 de junho, o presidente norte-americano Barack Obama fez um discurso na Universidade do Cairo, capital do Egito, na tentativa de conciliação com o povo muçulmano.
Na oportunidade, Obama defendeu o interesse e o respeito mútuo entre os Estados Unidos e o povo muçulmano e também, sugeriu a coexistência de um Estado Palestino e um Estado Israelita como pontos fundamentais para a pacificação.
No geral, a comunidade internacional entendeu o pronunciamento positivo, equilibrado e inovador na medida em que ele se diferencia de seus antecessores em aspectos cruciais, tais como quando clama por uma democracia de todos e para todos, onde não haja um único Estado tomador do poder e respectivamente das decisões. Mas Obama vai além no discurso, fala sobre a verdade, chama a atenção para a sinceridade nas relações exteriores, visando uma maior fluidez na cooperação e na pacificação...Ora, nesse ponto Obama superou o tom diplomático e paradoxalmente ingênuo, a ponto de querer condicionar a verdade dos Estados Unidos com a verdade daquele povo. O filósofo David Hume certamente, se estivesse vivo, estaria criticando firmemente a tal verdade absoluta mascarada através dos discursos demagógicos.
Por outro viés, Obama clama por cidadania, e nesse ponto, confesso que senti um certo “alívio”, ou simplesmente uma crença mais forte nas palavras em que ele, implicitamente, iluminou os direitos humanos e a dignidade dos seres humanos...
“ Eu tenho uma crença persistente de que todas as pessoas sentem falta de certas coisas – a capacidade de falar com sua mente e ter um diálogo sobre como você governa, a confiança no poder da lei e da administraçãoigualitária da justiça, o governo que é transparente e não rouba as pessoas, a liberdade para viver como se cada um escolher”, disse o presidente. “Essas não são idéias apenas americanas, são os direitos humanos. E é por isso que as apoiaremos em todos os lugares.”
Sem saber se o discurso de Obama vai dar certo e crendo que os comentários vindouros da mídia e dos “grandões internacionalistas” serão mera especulações, arriscaria dizer que o pronunciamento deste presidente está inovando no ocidente, por levar a todas as culturas do mundo a questão da racialidade americana e das relações etnocêntricas do EUA para com o mundo - além de que, avança no discurso político, uma vez que este ultrapassa as emissoras de rádio e televisão. Os discursos de Barack Obama estão sendo disseminados para o mundo todo através da internet...de sites como o youtube.com...e não há tempo determinado para que seja dado um replay no discurso.
O cientista social Antonio Engelks depois de ler as opiniões dos radicais de esquerda e de direitaacerca do pronunicamento, manifestou-se elegantemente e com inteligência de sobra a respeito do discurso de Barack Obama na Universidade do Cairo.
Da série “Contradições Delirantes e Paradoxos Esquizofrênicos”:
1. Radicais de direita não se cansam de proclamar a superioridade intrínseca da ordem liberal-democrática.
2. Quando questionados, justificam da seguinte maneira (com razão, diga-se): “ora, porque a democracia é o único regime que garante a liberdade dos indivíduos exercerem suas potencialidades; é o único que fornece um arcabouço teórico e jurídico que visa a minimizar o sofrimento, a crueldade e a dor humana; é o único que, em função dos princípios listados acima, permite e mesmo encoraja o sistema a melhorar e corrigir a si próprio”.
3. O fundamento filosófico do sistema liberal-democrático é o falibilismo. Que, em linhas gerais, consiste no reconhecimento de que toda tese é contingente: isto é, não há qualquer tese que esteja para além da possibilidade da dúvida. Se alguém disser que a tese X não pode ser colocada em dúvida, este alguém é um dogmático, não está agindo racionalmente. O falibilismo tende a levar ao que Weber chamou de “ética da responsabilidade”; o dogmatismo tende a levar à “ética da convicção”.
4. Mas, quando confrontado, o radical de direita abandona por completo a possibilidade de que possa estar errado: sua argumentação é desenvolvida exclusivamente por sobre a base da “convicção”, e não da “responsabilidade”. Tudo de que ele dispõe para debater são certezas absolutas, últimas , cujo mero questionamento já constitui uma impropriedade.
5. E, finalmente, quando algum moderado lhe chama a atenção sobre esta contradição — dizendo-lhe que o seu modo de proceder não está de acordo com os preceitos que ele, liberal-democrata, tanto diz defender, e no qual se arvora para justificar a sua superioridade — o radical de direita se refugia numa espécie de pragmatismo bastante peculiar: aquele que acusa qualquer outro tipo de pragmatismo de ser “frouxo”, “ingênuo”, “idealista”, e, portanto, não-pragmático.
6. Resumindo: o radical de direita absolutiza sua própria posição ao mesmo tempo em que acusa seus adversários de serem absolutistas.
E mais adiante:
Da série “Contradições Delirantes e Paradoxos Esquizofrênicos” (Parte 2):
1. Radicais de esquerda não se cansam dizer que o capitalismo é intrinsecamente perverso, e que sua forma política por excelência — a ordem liberal-democrática — também não é lá flor que se cheire, uma vez que lhe serve de suporte e garante o seu funcionamento.
2. Quando questionados, justificam da seguinte maneira (com alguma razão, diga-se): “ora, o capitalismo pode até gerar riqueza, mas gera muito mais desigualdade. Ele é bom apenas para uma minoria. A maioria — e aqui estamos falando não da maioria em um ou outro país desenvolvido, mas da imensa maioria da população mundial, bilhões de pessoas — é absolutamente explorada a um nível degradante: a maioria não vive, apenas sobrevive, e mesmo assim muito mal.”
3. A luta contra o capitalismo, portanto, não precisa de nenhum fundamento filosófico: a mera observação empírica basta. É simplesmente uma questão de justiça. Justiça para bilhões de indivíduos, que muitas vezes sequer têm consciência de que têm direito a uma vida mais digna. Logo, a tomada do poder, a instauração de uma ordem revolucionária com vistas a socializar a produção e distribuição de riquezas, não é apenas uma questão de conferir materialidade a esta abstração filosófica chamada “justiça”: é também e sobretudo um imperativo moral.
4. O problema é que, para tornar efetiva a socialização da produção e distribuição de riquezas, é necessário suprimir a liberdade individual das pessoas a um nível que para muitos é sufocante. Ninguém pode ter mais do que ninguém. Ninguém pode “ser” mais do que ninguém — embora, é claro, os membros do quadro político oficial “tenham” e “sejam” mais do que os cidadãos comuns que eles supostamente representam.
5. Não obstante, muitos se sentem sufocados, ou simplesmente ficam descontentes com o rumo que as coisas tomam, e partem então para criticar o governo. Isto, é claro, deixa a liderança política em pânico: pois trata-se, afinal, de um sistema que, para funcionar, exige a cooperação uníssona de todos. Se as vozes de descontentamento ganharem projeção e alcance, podem espalhar uma onda subversiva, colocando em risco a viabilidade do sistema. Daí a única alternativa: reprimir com mãos de ferro toda e qualquer possibilidade de crítica, de dissidência.
6. Quando questionados — isto é, quando criticados pelo fato absolutamente contraditório de que, em nome da criação de uma sociedade melhor e mais justa a liderança socialista não hesita em moer os indivíduos que a compõem, por razão pouca ou nenhuma –, os radicais de esquerda se refugiam numa espécie de messianismo auto-evidente: a Verdadeira Universalidade Futura, intrinsecamente virtuosa, a tudo redimirá.
7. Resumindo: o radical de esquerda é motivado pelo objetivo final de instaurar uma ordem justa, mas persegue este objetivo recorrendo a expedientes os mais injustos.
Raíssa Londero
Meu Deus!
ResponderExcluirAs tuas leituras estão aprimoradíssimas!!!
Toda a reflexão envolvida na vida do ser humano e da sociedade, o Direito como expressão máxima das necessárias transformações daracionalidade.
Parabéns!
Me orgulho da tua força e sensibilidade
Adorei, muito bom Raíssa! Sinto um imenso carinho por você e admiração! Abraços...
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